As incertezas do período eleitoral podem afetar o crédito, mas não devem impedir a continuidade da retomada gradual do mercado
O Banco Central aposta que o mercado de crédito bancário seguirá uma trajetória de gradual recuperação, a despeito das incertezas do período eleitoral, devido a forças mais perenes que vão sustentar a expansão dos empréstimos na economia, como juros mais baixos, queda da inadimplência e retomada ainda que lenta da atividade econômica.
Em julho, o estoque de operações de crédito do sistema bancário apresentou retração de 0,2%, mas a autoridade monetária atribui essa queda a fatores meramente sazonais, sobretudo uma menor tomada de empréstimos pelas grandes empresas.
Com os mercados mais turbulentos em agosto por causa da proximidade das eleições, que levaram o dólar para patamares acima de R$ 4,12 e pressionaram os juros no mercado futuro, alguns analistas econômicos receiam que a incipiente retomada do mercado de crédito poderá ser afetada.
Nossa expectativa é que as condições do crédito continuem gradualmente a se distender, mas um cenário externo desafiador aliado a incertezas políticas elevadas antes das cruciais eleições presidenciais e legislativas de outubro podem moderar tanto a oferta de crédito pelos bancos como a demanda das empresas e das famílias, afirma o economista-chefe para a América Latina do Goldman Sachs, Alberto Ramos.
Depois de um ciclo de expansão que durou cerca de uma década, o mercado de crédito caiu nos dois últimos anos, em 2016 e 2017, e avança muito lentamente neste ano. Em 12 meses, o crescimento acumulado até julho é de 2,4%, o que significa que o crédito ainda encolhe em termos reais.
O chefe do Departamento de Estatísticas do Banco Central, Renato Baldini, reconheceu que as incertezas do período eleitoral podem afetar o crédito, mas ponderou que não devem impedir a continuidade da retomada gradual do mercado. "Diria que as condições para a recuperação do mercado de crédito estão dadas, e devem contribuir para que se prolongue na medida em que as incertezas em outros campos sejam reduzidas", afirmou.
Em julho, chamou a atenção a queda de 10,4% nas concessões de crédito para as empresas e o aumento de 0,4 ponto na taxa de juros média cobrada nesses financiamentos, que passou para 15,9% ao ano.
Segundo Baldini, esses movimentos refletem o fato de, no mês, haver uma redução sazonal nos empréstimos concedidos às grandes empresas em linhas como desconto de duplicatas e antecipação de recebíveis. Como envolvem grandes operações, em geral as taxas são relativamente mais baixas.
Descontados os efeitos sazonais, as concessões aumentaram 2,2% para as empresas no mês, segundo o BC, mesma variação observada nas concessões totais. Sem o ajuste, as estatísticas oficiais mostram uma retração de 3,9% nas concessões.
O economista do BC destacou, ainda, que muitas empresas têm buscado crédito no mercado de capitais, em operações que não são captadas nas estatísticas divulgadas nesta manhã, que se referem apenas ao financiamento bancário.
As concessões de crédito para as pessoas físicas aumentaram 1,6% no mês. Em 12 meses, a alta acumulada é de 9,4%, com destaque para o crescimento de 25,8% das concessões de crédito consignado e de 22% dos empréstimos para a compra de veículos.
A taxa média cobrada no financiamento no cartão de crédito dos clientes que fazem o pagamento mínimo em dia voltou a cair em julho, depois de uma alta expressiva no mês anterior. A taxa ficou em 252,1% ao ano, ante 261,1% em junho e 242,6% em maio.
Entre 2004 e meados de 2014, o mercado de crédito duplicou como proporção do Produto Interno Bruto (PIB), passando de 25% para 50%, devido a aperfeiçoamentos em leis que melhoraram as garantias dos empréstimos e à maior demanda por financiamento durante o ciclo de expansão da economia.
A partir de 2008, o mercado ganhou novo impulso com o uso dos bancos públicos pelo governo para estimular à economia, em meio à crise financeira internacional provocada pela quebra do banco Lehman Brothers. Quatro anos depois, o governo Dilma determinou que as instituições oficiais cortassem juros para estimular maior concorrência no mercado.
O modelo de expansão do crédito baseado nos bancos públicos se esgotou devido à queda da rentabilidade e erosão da base de capital das instituições federais. O governo Temer retomou a agenda de reformas para estimular a expansão do crédito, mas algumas das mais importantes, como a que aperfeiçoa o cadastro positivo, ainda não avançou no Congresso.
Paralelamente, o BC cortou os juros básicos da economia, de 14,25% ao ano para 6,5% ao ano, mas muitos analistas têm afirmado que os efeitos na oferta de crédito têm sido limitados. O BC, porém, publicou estudos que mostram que o mercado de crédito está reagindo aos estímulos da mesma forma que nos ciclos anteriores de distensão monetária e que o mercado já está engrenando, de forma gradual.