Henrique Castilhano Villares: Sicoob continua a crescer mesmo em época de crise
As cooperativas de crédito vêm ganhando espaço e garantindo a seus associados serviços semelhantes aos dos bancos, mas com custos em geral mais atraentes. Enquanto o crédito bancário anda de lado e, segundo previsões do Banco Central (BC), deve fechar 2017 empatado com 2016, as operações de empréstimos das cooperativas avançam, apesar do ritmo menor. Dados divulgados em setembro pelo BC mostram que elas cresceram 8% em 2016 sobre 2015, para perto de R$ 78 bilhões. E as estimativas do setor são de nova expansão este ano.
No dia 19 de outubro foi celebrado o Dia Internacional das Cooperativas de Crédito. Hoje, segundo dados do Conselho Mundial de Cooperativas de Crédito World Council of Credit Unions (Woccu) mais de 223 milhões de pessoas no mundo participam como associadas do sistema, em 60,5 mil cooperativas instaladas em 109 países. Enquanto em nações como a França e a Alemanha o cooperativismo de crédito é forte agente do sistema financeiro, no Brasil, essas cooperativas, que já reúnem mais de 9 milhões de cooperados, ainda buscam ganhar escala e se consolidar.
Segundo Ênio Meinen, diretor de Operações do Banco Cooperativo do Brasil (Bancoob), as operações de crédito do Sicoob, maior sistema cooperativo do país, devem fechar o ano com alta de pelo menos 8% sobre o ano passado. O Bancoob é um banco múltiplo privado especializado no atendimento a cooperativas de crédito, cujo controle acionário pertence a entidades filiadas ao Sicoob.
No primeiro semestre, as operações de crédito do Sicoob cresceram 7,8% sobre igual período do ano anterior. Ao mesmo tempo, a inadimplência acima de 90 dias se mantém relativamente baixa, passando de 3,28% em junho de 2016 para 3,38% em junho deste ano.
Meinen estima, para o sistema cooperativo brasileiro como um todo, expansão nas operações de crédito também em torno de 8% em 2017, e, para os ativos totais administrados por essas entidades, que somavam R$ 148 bilhões em dezembro do ano passado, um crescimento maior, na casa dos 20%, mantendo o ritmo dos últimos anos.
Nos anos de 2014 e 2015, lembra Meinen, a expansão das operações de crédito das cooperativas no país como um todo foi mais expressiva, de 19% e 17%, respectivamente. Com a crise, também crescemos menos, mas continuamos bem acima dos bancos convencionais, que em 2016 tiveram desempenho negativo, ressalta.
Participação e ganhos de escalaMas, apesar da forte expansão tanto em empréstimos como em ativos, o diretor do Bancoob destaca que um dos grandes desafios do segmento no Brasil é ganhar escala. As cooperativas de crédito representam hoje perto de 4% do consolidado do Sistema Financeiro Nacional (SFN) ou PIB financeiro do país, diz. Na Alemanha, essa participação das cooperativas é de 20%, e na França, supera os 50%.
O Sistema de Cooperativas Financeiras do Brasil (Sicoob), possui 3,7 milhões de cooperados em todo o país e está presente em todos os estados brasileiros e no Distrito Federal. É composto por 476 cooperativas singulares, 16 cooperativas centrais e a Confederação Nacional das Cooperativas do Sicoob (Sicoob Confederação).
Integram ainda o sistema o Banco Cooperativo do Brasil do Brasil (Bancoob) e suas subsidiárias provedoras de produtos e serviços especializados para cooperativas financeiras como empresas de cartões, consórcios, DTVM, seguradora e previdência. A rede Sicoob é a sexta maior entre as instituições financeiras que atuam no país, com mais de 2,6 mil pontos de atendimento.
Recuperação lenta da economiaO desempenho geral do Sicoob no primeiro semestre de 2017 foi positivo e manteve o patamar elevado dos números para o período, apesar da lenta recuperação da economia brasileira. Um dos principais destaques é o número de ativos totais. Foram R$ 83,4 bilhões registrados no primeiro semestre, um salto de 23,2% sobre o mesmo período do ano passado.
As cooperativas do sistema Sicoob encerraram o primeiro semestre de 2017 com lucro líquido (sobras) de R$ 1,25 bilhão, um crescimento de 9,1% em relação ao mesmo período de 2016. Outro número relevante é o de novos associados: 412 mil, uma alta de 12,4% no período. Atribuímos este indicador à política dos melhores juros do nosso principal produto, que é o crédito, afirma o presidente do Sicoob, Henrique Castilhano Villares.
Taxas de juros até 56% menoresAs taxas de juros para tomadores de recursos no Sicoob, segundo a instituição, são bastante competitivas tanto para pessoas físicas como jurídicas.
Tomando como referência novas operações realizadas em agosto, a taxa média no crédito pessoal para pessoas físicas estava em 3,15% ao mês. Segundo a instituição, o equivalente a 44% da taxa de juros médios (7,20% ao mês) cobrada pelos bancos tradicionais na mesma modalidade no período. Ou seja, 56% menos que a taxa média dos bancos.
Já para as empresas que buscaram operações de capital de giro a média era de 2,28% ao mês, equivalente a 80% da média dos bancos, de 2,82% ao mês.
Rede de agênciasA rede de atendimento também cresceu e chegou a 2.626, um acréscimo de 146 novas agências, o que representa um aumento de 5,6% em relação período anterior. O patrimônio líquido somou R$ 16,9 bilhões, uma alta de 13,9% se comparado ao primeiro semestre de 2016. Os depósitos somaram R$ 52,9 bilhões, aumento de 23% sobre 2016, com destaque para os depósitos a prazo, que evoluíram 24,1%, e os depósitos à vista, que cresceram 23,9%.
O patrimônio líquido das cooperativas somou R$ 16,9 bilhões, alta de 13,9% se comparado ao primeiro semestre de 2016. Os depósitos do sistema atingiram R$ 52,9 bilhões, aumento de 23% sobre 2016, com destaque para os depósitos a prazo, que evoluíram 24,1%, e depósitos à vista, que cresceram 23,9%.
O Sicoob remunerou em R$ 797 milhões o capital social dos cooperados relativos às sobras (lucro gerado) de 2016. O Capital Social é parte do patrimônio de uma cooperativa financeira e é composto pelo somatório de todas as quotas-partes dos cooperados. A perspectiva de crescimento do lucro (sobras) divididos entre os cooperados para este ano é de 12%.
Como participar das cooperativasPara as pessoas físicas interessadas em se associar a uma cooperativa de crédito, são necessários documento de identificação (RG), comprovante de residência e comprovante de renda. Já para micro e pequenas empresas, é preciso apresentar cartão do CNPJ, comprovante de endereço e de faturamento, além de documentos dos sócios (os mesmos das pessoas físicas).
Para ter acesso aos produtos de uma cooperativa de crédito é necessário ser associado e estar de acordo com seu estatuto social. O interessado terá ainda de integralizar um capital social, em valor que varia de acordo com cada cooperativa.
Normalmente estes valores ficam nas cooperativas, até que o associado decida deixar a sociedade. A forma da devolução deste capital tem de constar nos estatutos, que ficam à disposição dos associados.
Opção de investimentosAs cooperativas de crédito também são opção para quem procura alternativas seguras e rentáveis para investir. Elas podem oferecer produtos para diferentes perfis, sejam pessoas mais conservadoras ou mais dispostas ao risco.
As carteiras dessas instituições podem oferecer tanto a conhecida caderneta de poupança como o RDC (Recibo de Depósito Cooperativo, aplicação equivalente ao CDB dos bancos), LCI, LCAs ou fundos de investimentos.
Modelo participativoSegundo definição do BC, cooperativa de crédito é a instituição financeira formada pela associação de pessoas para prestar serviços financeiros exclusivamente aos seus associados. Os cooperados são ao mesmo tempo donos e usuários da cooperativa, participando de sua gestão e usufruindo de seus produtos e serviços. A assembleia de associados decide sobre o planejamento operacional da cooperativa.
Nessas cooperativas, os associados encontram os principais serviços disponíveis nos bancos, como conta-corrente, aplicações financeiras, cartão de crédito, empréstimos e financiamentos. Eles têm poder igual de voto, independentemente da sua cota de participação no capital social da cooperativa. O cooperativismo não visa lucros, os direitos e deveres de todos são iguais e a adesão é livre e voluntária.
Ganhos e perdasAinda de acordo com informações do Banco Central, o resultado positivo da cooperativa é conhecido como sobra e é repartido entre os cooperados em proporção com as operações que cada associado realiza com a instituição.
Assim, os ganhos voltam para a comunidade dos cooperados. No entanto, da mesma forma que partilha das sobras, o cooperado está sujeito a participar do rateio de eventuais perdas caso seja insuficiente para cobri-las o fundo de reserva. Em ambos os casos, isso ocorre na proporção dos serviços usufruídos.
Isenção de tributosOutro diferencial das cooperativas que ajuda na redução de custos é a isenção de determinados tributos sobre o crédito. Amparadas por legislação específica, elas são isentas de alguns impostos como o Imposto de Renda, PIS, Confins e CSLL. Mas isso vale apenas para chamados atos cooperativos, que são as operações realizadas entre a cooperativa e seus cooperados para cumprir seus objetivos estatutários.
No entanto, vale lembrar que em função do Decreto 9.017/2017, as operações de crédito deixaram de ter a isenção do IOF, equiparando-se as alíquotas básicas nas cooperativas às praticadas pelos bancos comerciais. E que não são considerados atos cooperativos, portanto não isentos, operações de prestação de serviços que não sejam objeto específico das cooperativas, como é o caso de negociação de seguros e consórcios, por exemplo.
Fundo garantidorO site do BC esclarece que as cooperativas de crédito são autorizadas e supervisionadas pelo Banco Central. Os depósitos em cooperativas de crédito têm a proteção do Fundo Garantidor do Cooperativismo de Crédito (FGCoop).
Esse fundo garante os depósitos e os créditos mantidos nas cooperativas singulares de crédito e nos bancos cooperativos em caso de intervenção ou liquidação extrajudicial das instituições. O valor limite dessa proteção é o mesmo em vigor para os depositantes dos bancos, o que significa que o total de créditos de cada pessoa contra a mesma cooperativa será garantido até o valor de R$ 250 mil.
Colaboração e spreads menoresPara Ricardo Humberto Rocha, especialista em economia e finanças e professor da Saint Paul Escola de Negócios, as cooperativas de crédito vêm se expandido com força no Brasil, e tendem a crescer ainda mais num ambiente de juros baixos e maior estabilidade.
Na Europa essas cooperativas têm uma participação muito maior no sistema financeiro, lembra Rocha. Ele acrescenta que é bastante positivo que elas ganhem escala em nosso país, onde ainda é muito forte a concentração bancária, pois têm caráter colaborativo e tendem a praticar spreads (diferença entre o que os bancos pagam na captação de recursos e o que cobram na concessão de empréstimos) menores, mais comportados que o dos bancos.
Cautela com perdas e busca de informaçãoRocha alerta, contudo, que antes de participar de uma cooperativa de crédito é preciso buscar o máximo de informações sobre ela junto à comunidade, ao Banco Central, tentar saber se houve rateio de perdas, entender como o sistema funciona o que nem sempre as pessoas estão dispostas a fazer.
Se o objetivo for tomar crédito para fazer replanejamento financeiro, trocando dívidas mais caras por outras mais baratas, é necessário comparar não apenas taxas de juros e de administração, mas também os prazos e demais condições do financiamento.
A escolha (procurar uma cooperativa ou um banco) vai depender muito da necessidade da pessoa ou da empresa, ressalta.
Lembra ainda que muitas vezes a cooperativa poderá ser interessante não apenas por uma questão de custos, mas por estar em regiões mais afastadas (dos centros urbanos), em que existem poucas ou nenhuma agência bancária, e/ou pelo fato de essa intermediação financeira fortalecer a atividade econômica na própria comunidade ou região.
Cooperados e pontos de atendimentoRodrigo Severiano Dias, consultor técnico de cooperativismo de crédito da Organização das Cooperativas do Estado de S.Paulo (Ocesp), destaca que hoje existem perto de 5.700 pontos de atendimento dessas cooperativas no país (a maior rede do Sistema Financeiro Nacional, segundo dados do Relatório Anual do Sistema Nacional de Crédito Cooperativo (SNCC) / 2016), atendendo 5.580 municípios.
Ele lembra que segundo os últimos dados divulgados pelo Banco Central, o Brasil contava em 2016 com 1.017 cooperativas de crédito (menos 4% em comparação a dezembro de 2015) e 8,9 milhões de cooperados (7% a mais que no ano anterior). Em dezembro de 2016 houve expansão na casa de 8% no volume de empréstimos (livres de provisão) sobre dezembro do ano anterior, para R$ 77,1 bilhões.
Sexta posição em depósitosSe as cooperativas de crédito fossem um banco, seriam o 7º maior banco do país (levando em conta o BNDES) em total de depósitos, e o 6°, sem contar o BNDES, diz Ronaldo Nagai, consultor contábil do Sescoop (Serviço Nacional de Aprendizagem do Cooperativismo) e membro do Centro de Estudos do Mercado Financeiro e de Capitais (CEM) da Faculdade de Direito da USP.